domingo, 27 de abril de 2008

A revisão do Código de Trabalho, a precariedade e o precariado

“Contratos a prazo vão sair mais caros às empresas”, “Trabalho precário sai mais caro a empresas” ou “Patrões vão pagar caro recibos verdes”. São capas da manhã de 4ª feira passada, 23/04, o dia seguinte ao início da concertação social para revisão do Código de Trabalho. O Governo garantiu na imprensa o essencial da sua propaganda, de uma forma segura ao ponto dos títulos dos diferentes jornais serem quase indistinguíveis. Uma vitória de Sócrates, Vieira da Silva e companhia, pode pensar-se. Mas, enquanto olhamos com olhos de ver paras as propostas do Governo, já sabemos uma coisa: há um outro lado da moeda da precariedade – o precariado está aí e o Governo já tem que lhe responder.

Algumas propostas do Governo, entre a propaganda e a realidade:


Os patrões passam a pagar 5% da Segurança Social dos trabalhadores independentes. Ou seja, dos trabalhadores a recibos verdes. Responsabilizar em parte os patrões, diz o Governo. A folga dos patrões e, sobretudo, a irresponsabilidade do Estado continua: os trabalhadores a recibos verdes pagam 95% da contribuição para a Segurança Social, mas não têm direito, por exemplo, a subsídio de desemprego!


Alargamento da licença parental. Supostamente, passa a ser possível articular entre pai e mãe um ano para olhar pelos filhos. Mas para “conciliar a vida profissional e pessoal” é preciso ter um/a companheir@ e, sobretudo, ter um bom ordenado, porque os últimos meses terão que ser passados apenas com 25% do vencimento.


Contratos a prazo passam a ter limite de 3 anos. O limite era de 6 anos, é verdade. Mas não vale a pena tentar enganar: este mesmo Vieira da Silva, em 2002, na sua passagem pelo Governo de Guterres, reduziu aquele limite para 1 ano. Não há nada de corajoso neste novo limite. 3 anos a prazo é bom? Só se for no Governo…

Taxa Social Única (TSU) para empresas dependente dos vínculos laborais. Os patrões passam a pagar menos 1% de TSU, mas pagarão 3% mais se tiverem “uma percentagem significativa” de trabalhadores com contratos a termo.

Facilitação dos despedimentos, “adaptabilidade”, num país em que, nas palavras do próprio Veira da Silva “se hoje fosse difícil despedir em Portugal, não haveria o nível de desemprego que existe”.



Ontem, num encontro com militantes do PS em Vila Franca de Xira, Sócrates demonstrou pressentir que ainda tem muita gente para convencer. Garantiu que “nenhum Governo antes de nós atacou os contratos a prazo”, afirmando-se “preocupado com os recibos verdes”. Mas, entusiasmado, depois de atacar violentamente quem não concorda com as propostas do Governo, lá deixou soltar que “as convenções colectivas de trabalho são um atraso de vida! Um atraso de vida!”.

A precariedade é a proposta do Governo. Para lá dos rebuçados e da propaganda, é o que sobra. Bagão Félix, autor do Código anterior, até se permite dizer que “em alguns aspectos, se está a ir longe de mais”. Os patrões nem piam, à espera que a coisa passe para galgar mais qualquer coisa. Os “comentandores” insistem sobre a necessidade de flexibilizar as leis laborais, mas lá têm uma palavra de apreço para a triste sina dos recibos verdes e similares. É este o “consenso alargado” que Vieira da Silva diz esperar – o consenso dos privilegiados, que urram inevitabilidades e pedem mais um bocadinho das nossas vidas.

Maio está aí. E o precariado também. Precisamos de acumular gente e forças para dar a volta à precariedade. Com imaginação e com a alegria dos inquietos, o precariado contra-ataca a 1 de Maio. MayDay!! MayDay!!

Tiago Gillot

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